Alejandro Zambra

2 posts

Poeta Chileno

Ontem à noite voltei à obra de Alejandro Zambra através de Poeta Chileno. Mais uma vez fisgado pelo realismo sem firulas da prosa do escritor santiaguino.

Em mais uma história ambientada em Santiago, me vi compreendendo uma série de referências a lugares, comidas e da capital do Chile, que pude experimentar nas duas vezes em que estive na cidade.

Da mesma forma, as pequenas piscadelas que Zambra dá aos leitores da sua geração (sou de 82, ele de 75), sobretudo ao citar músicas, bandas, e videogames mais universais e caros a quem cresceu nos anos 1980 e 1990 e estava minimamente atento à cultura pop daquele período, criam um vínculo que me parece bem mais natural do que em outras obras que lançam mão de referências generacionais, como Jogador Nº 1, de Ernest Cline.

Ler Alejandro Zambra mais uma vez tem feito pensar sobre um aspecto da minha produção artística que eventualmente retorna às minhas reflexões: a dualidade “local-universal”.

São impressões semelhantes às que tenho tido ao imergir na obra de Haruki Murakami ao longo dos anos. Sem exceções, ao longo da sua produção de ficção, o autor japonês abusa do recurso a citações à cultura ocidental, sobretudo a música e compositores, ao passo que não abre mão de especificar detalhes, como nomes de ruas, bairros, estações de trem, modos de preparos de alimentos, específicos das cidades japonesas em que as suas histórias se desenrolam.

Em algumas composiões minhas mais recentes, venho conscientemente tentar lançar mão de referências tipicamente natalenses, como é o caso da “camisa do Alecrim” que o narrador da letra da canção Desapego menciona.

O verso mencionado começa por volta de 20s.

De certa maneira, porém, me preocupo com a forma com que essas referências aparecem nas minhas músicas, de modo que possam fazer sentido para ouvintes que não compartilham das experiências de viver no lugar de onde escrevo.

Por outro lado, me interesso muito mais por essas pequenas inserções, nas minhas letras, de fragmentos da experiência do que é ser natalense, do que propriamente fazer da canção uma listagem de supostas qualidades da cidade ou do estado em que nasci e onde vivo.

Continuarei atento a como essa questão tem sido abordada na música que consumo e em outras expressões artísticas.

Livros lidos em 2022

Mais uma vez Haruki Murakami integrou a minha lista de lidos. 2022 foi o ano em que descobri Alberto Mangel e a sua escrita envolvente sobre livros e literatura. Também enveredei por algumas leituras de obras de críticos de música como Luiz Felipe Carneiro e Ricardo Alexandre, descobri a obra do chileno Alejandro Zambra e li o meu primeiro Philip Roth, além do primeiro não-ficção de Paul Auster.

Mantendo a tradição, segue a relação de livros lidos ao longo do ano, com alguns comentários sobre os títulos que mais me chamaram a atenção:

A Marca Humana
Philip Roth

Minha primeira experiência com Philip Roth. Lançado em 2000, o livro do autor parecia antecipar reflexões sobre o que hoje a gente chama de cultura de cancelamento e colorismo. Outro aspecto latente em toda a obra é a questão das identidades fragmentadas, problematizada na trajetória do protagonista Coleman Silk.

A Invenção da Solidão
Paul Auster

Aqui Paul Auster reflete sobre a sua relação com o pai ao longo dos tempos, logo após a morte deste e ao se ver precisando lidar com as lembranças materiais e memórias afetivas que surgiam à medida que explorava o apartamento do pai, agora desocupado.

Encaixotando minha biblioteca
Alberto Manguel

Conheci esse livro através de indicação na newsletter de Gaía Passarelli. Na obra, Alberto Manguel faz uma série de reflexões sobre livros, literatura e crítica literária, enquanto tinha que lidar com o encaixotamento da sua volumosa biblioteca, ao se ver na situação de precisar se mudar de uma ampla casa no interior da França, para Nova York.

Com Borges
Alberto Manguel

Borges perdeu a visão aos 55 anos, em consequência de uma condição genética. Em razão disso, passou a só ter acesso ao conteúdo de livros através de amigos com quem contava como leitores. Alberto Manguel foi um deles e esse pequeno livro é um delicioso relato do período em que Manguel conviveu com o autor de O Aleph.

Four Thousand Weeks: Time Management for Mortals
Oliver Burkeman

Há pelo menos 10 anos venho me interessando muito sobre discussões a respeito de produtividade e o seu entorno, de aplicativos para gerenciamento de tarefas a abordagens como o GTD. Após um aumento considerável em meus níveis de ansiedade, problematizado em sessões de terapia e durante a leitura de Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han, passei a ter um entendimento mais cético em relação a essa busca por produtividade. O livro de Oliver Burkeman traz reflexões inspiradoras e convincentes sobre o tema.

Lado C: a trajetória musical de Caetano Veloso até a reinvenção com a Banda Cê
Luiz Felipe Carneiro e Tito Guedes

No piloto do excelente podcast Discoteca Básica, Ricardo Alexandre sugere alguns trabalhos de jornalismo musical a se seguir. Dentre essas sugestões está o canal Alta Fidelidade, no Youtube, de Luiz Felipe Carneiro, autor do livro.

A obra foca no período em que Caetano trabalhou com a bandaCê, no Cê, Zie & Zie e Abraçaço, mas também aborda a experiência do compositor com outras bandas como a Black Rio e a Outra Banda da Terra.

Em relação à trilogia lançada entre 2006 e 2012, fica a constatação da minha caretice e ignorância no momento em que ouvi os dois primeiros discos. Ouvi bem pouco o Zie & Zie e gostei de imediato dos outros dois, apesar de ter recebido com estranheza a crueza e minimalismo dos arranjos de Cê. À época eu interpretava aquela proposta estética mais como limitação dos músicos que acompanhavam Caetano, do que uma escolha intencional e calculada. O cuidado que o livro teve em apresentar as trajetórias individuais dos integrantes da bandaCê trouxeram um contexto que me permitiu compreender melhor aqueles trabalhos.

Cheguei bem a tempo de ver o palco desabar: 50 causos e memórias do rock brasileiro
Ricardo Alexandre

Livro delicioso de Ricardo Alexandre, do já mencionado Discoteca Básica. Aqui o autor faz um relato bastante pessoal da sua trajetória enquanto crítico musical de veículos como a Bizz e Estadão e de como a sua própria carreira acompanhou as flutuações da indústria fonográfica entre o começo dos anos 1990 e o final da primeira década dos anos 2000. Também vale por várias histórias de bastidores de bandas como Skank, O Rappa, Los Hermanos, Pato Fu, Raimundos e várias outras.

Caçando Carneiros
Haruki Murakami

Após o anoitecer
Haruki Murakami

 

Falso Espelho
Jia Tolentino

Cidade Aberta
Teju Cole

O Efeito Rosie
Grame Simsion

Bonsai
Alejandro Zambra

A Vida Privada das Árvores
Alejandro Zambra

* * *

Desde 2016 venho listando as minhas leituras anuais. Veja que livros foram lidos por aqui em anos anteriores: 2021, 2020, 2019, 2018, 2017, 2016.

Todos esses compilados anuais estão reunidos aqui.